Homenagem FBG MULHER – Dia Internacional da Mulher


“No dia que for possível à mulher amar em sua força e não em sua fraqueza, não para fugir de si mesma, mas para se encontrar, não para se renunciar, mas para se afirmar, nesse dia o amor tornar-se-á para ela, como para o homem, fonte de vida e não perigo mortal” (Simone de Beauvoir, 1980).

               Não foi só um dia. Foram muitos. Esse dia começou há muitos anos atrás e foi fruto de uma árdua batalha de muitas mulheres que nunca aceitaram ser colocadas numa situação de inferioridade pelo simples fato de ser mulher. Não podemos esquecê-las e fazer memória de suas lutas é uma forma de agradecimento, mas também de resistência e insistência em continuar lutando contra todas as formas de dominação das mulheres no campo político, social, econômico e pessoal.

            A origem do Dia Internacional da Mulher remete primeiramente a Clara Zetkin (1857-1933), membro do Partido Comunista Alemão, que no II Congresso Internacional de Mulheres Socialistas em Copenhagem, em 1910, propôs a criação de um Dia Internacional da Mulher sem definir uma data precisa.

            Remete ainda ao dia 8 de março de 1917, quando cerca de 90 mil operárias russas percorreram as ruas reivindicando melhores condições de trabalho e de vida, ao mesmo tempo que se manifestavam contra as ações do Czar Nicolau II. Esse dia ficou conhecido como “Pão e Paz”, porque as manifestantes também lutaram contra as dificuldades decorrentes da Primeira Guerra Mundial (1914-1918).

            No dia 25 de março de 1911 um incêndio em Nova Iork, na fábrica Triangle Shirtwaist Company matou 146 mulheres, dentre as 500 que trabalhavam lá, de 12 a 14 horas por dia para receberem 6 a 10 dólares por semana. A fábrica adotava a mesma política das outras:  portas fechadas durante o expediente, relógios cobertos, controle total, inclusive das idas ao banheiro, baixíssimos salários e longas jornadas de trabalho.

            Na luta por melhores condições de vida, trabalho, igualdade salarial, direito ao voto, emergiram nos movimentos sindicais e políticos muitas mulheres que foram construtoras de uma nova consciência do papel da mulher como trabalhadora e cidadã. Clara Zetkin, Alexandra Kollontai, Clara Lemlich, Emma Goldman, Simone Weil e outras militantes que dedicaram suas vidas ao que posteriormente se tornou o movimento feminista.

           Em homenagem à luta e às conquistas das mulheres, o Dia Internacional da Mulher foi definitivamente instituído pela ONU no ano de 1975, sendo que a escolha do dia 8 de março está relacionada com a greve das operárias russas de 1917.

           No Brasil, tivemos muitos marcos importantes da luta das mulheres que passam pelas sufragistas que nos garantiram o direito ao voto (1932), à criação do Conselho Nacional dos direitos das Mulheres (1985). Porém, a longa trajetória de luta das mulheres e dos movimentos feministas teve na Constituição Federal (1988) um marco importante quando, finalmente, houve um reconhecimento formal por parte do Estado da igualdade de direitos entre mulheres e homens.

            Como consequência dessas lutas, diversas leis foram conquistadas: contra o estupro (1990) e o atentado ao pudor (1994) como crimes hediondos, a de quotas mínimas de 20% para candidaturas de mulheres nos partidos políticos (1995) e de 30% a partir de 2017, o novo Código Civil (2002) que garantiu a capacidade civil plena da mulher ao permitir que a mãe possa fazer o registro de nascimento dos filhos, que antes competia apenas ao pai e a importante lei Maria da Penha (2006) que criou mecanismos jurídicos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.

          A agenda pela igualdade de direitos das mulheres percorreu um longo caminho, entretanto temos ainda grandes desafios a serem vencidos:

  1. A Violência sexual e doméstica: 4 mulheres morrem por dia vítima de feminicídio no Brasil (de janeiro a outubro de 2023, 1.158 foram mortas). Só no 1º semestre de 2023, 34 mil mulheres foram estupradas no Brasil.
  2. Desigualdade no mercado de trabalho: o rendimento médio mensal das mulheres no mercado de trabalho brasileiro é 21% menor do que o dos homens. As mulheres recebem menos até nos setores em que são maioria, como  nos serviços domésticos, que ocupam cerca de 91% das vagas e o salário é 20% mais baixo que o dos homens. Em educação, saúde e serviços sociais, mulheres representam 75% do total e têm rendimentos médios 32% abaixo dos recebidos pelos homens.
  3. Desigualdade racial e social: o abismo salarial entre homens e mulheres é fato. No entanto, na comparação entre mulheres brancas e negras, a diferença pode chegar a até 71%. Em relação à violência, de acordo com o “Dossiê Mulheres Negras: retrato das condições de vida das mulheres negras no Brasil”, feito pelo IPEA, as mulheres negras ainda são as maiores vítimas de feminicídio no país. Na educação, segundo o mesmo levantamento, apenas 5,2% das mulheres negras no Brasil alcançam o ensino superior, contra 18,2% das mulheres brancas. A fome no Brasil tem gênero: são mulheres negras, pobres, periféricas e que cuidam sozinhas dos filhos.
  4. Pouca representação e participação política das mulheres: Há um deficit de representação feminina em várias instâncias de poder (seja tomando como referência os legislativos estadual, federal ou municipal ou os cargos executivos em todos os níveis). Apesar das mulheres constituírem a maioria tanto na população (51,1%) como no eleitorado (52,62%), nas Eleições Gerais de 2022, por exemplo, 9.891 mulheres se candidataram, porém somente 311 delas foram eleitas, correspondendo a apenas 18,2% do total de eleitos.
  5. Dificuldades na implementação das políticas públicas para as mulheres: é necessário compreender que as políticas públicas com recorte de gênero são as que reconhecem a diferença de gênero e, com base nesse reconhecimento, implementam ações diferenciadas dirigidas às mulheres. São políticas afirmativas no campo social, econômico, político, cultural que deverão ser transversais, articuladas em todos os níveis (federal, estadual e municipal), institucionalizadas e dirigidas ao empoderamento de todas as mulheres.

Há muito mais a ser feito, desfeito, corrigido para que o Dia Internacional da Mulher não seja apenas um dia de nos presentear com flores, chocolates e jantares. Dia de fazer memórias às mulheres de todas as raças, credos, opções sexuais e etnias que sonham com um jeito novo de conviver em sociedade. Dia de luta que busca afirmar nossas diferenças para promover a igualdade entre homens e mulheres, respeitando as diferenças biológicas para que elas não sirvam de pretexto para subordinar e inferiorizar a mulher.

Joceli Oliveira dos Santos – Membro da Comissão FBG Mulher

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